Michael Jackson, um pai exemplar


¨O Dia de Ação de Graças é o maior dia do ano para as famílias americanas. É quando em todas as casas dos Estados Unidos janta-se peru com todas aquelas decorações e a torta de abóbora.

Foi um jantar tão típico aquele em que eu passei a Ação de Graças há dois anos - porém, com uma família americana um tanto atípica, já que os convidados na casa dos meus amigos de Nova Jersey eram Michael Jackson, seu filho de 5 anos de idade, Prince Michael I, e a filha de 3, Paris.

Sim, o mesmo Michael Jackson que, após ter balançado seu filho mais novo, Prince Michael II, numa sacada de 15 metros em Berlim, é agora taxado como o pior pai do mundo. A despeito do pretexto desprezível de seu comportamento excêntrico, assistentes sociais contaram-me que se o incidente tivesse acontecido neste país [Inglaterra], todos os seus três filhos poderiam ter lhe sido tirados de guarda.

No entanto, baseado nos quatro meses em que passei ao redor de Michael e de suas duas crianças mais velhas, antes e após o Dia de Ação de Graças, cheguei a uma conclusão controversa: Jackson não é esse péssimo pai que está sendo retratado. E não apenas isso, mas também Prince Michael I e Paris estão, pela minha experiência, dentre as mais comportadas, menos mimadas e mais equilibradas das crianças.

Durante meu tempo com os filhos de Jackson, consegui conhecê-los bastante bem. Eu li para eles, com Paris no meu colo e Prince sentando perto de mim. Também repreendi Prince por passar em cima do meu pé com um trator de brinquedo.

(Ele respondeu educadamente dizendo "desculpe", e repetiu o pedido com a indução de seu pai, que não achou que o primeiro tivesse soado "desculpa o suficiente")

Este não era o comportamento mimado e mal-educado pelo qual eu esperava. E outras surpresas aconteceram. Os filhos de Jackson da crença popular vivem isolados e são proibidos de terem contato com outras crianças. Porém, eu os vi brincando por horas com amigos.

Os filhos de Jackson supostamente têm todos os seus brinquedos destruídos ao fim do dia por medo de infecção. No entanto, eu os vi apertando e sugando aqueles brinquedinhos de plástico que todas as crianças têm.

Eu fui a uma loja de brinquedos com Prince e Paris numa das farras de compras secretas de Michael. Aconteceu às 7 horas da noite, e foi interrompida rapidamente porque a hora das crianças irem para cama estava chegando - cada uma pôde levar apenas um brinquedo.

Jackson pode ser neurótico, excêntrico e totalmente esquisito, mas Prince e Paris são espertos, seguros, carinhosos e atenciosos. Eles oram antes das refeições, falam em frases completas, em vez dos grunhidos monossilábicos americanos, e são proibidos, como muitas crianças, de usarem linguagem grosseira.

Prince tem um rosto sério, mas uma natureza travessa e uma curiosidade implacável. Embora seja cercado por uma equipe alerta para cumprir as ordens de seu pai, eu não encontrei um sinal de arrogância nos modos do garotinho. Paris era muito pequena quando eu a conheci, com um rostinho bonito e marcante, sempre competindo com Prince para ser a primeira a pular no joelho do pai.

Como Jackson está divorciado da mãe de seus filhos, Debbie Rowe, eles foram cuidados por Grace, a governanta, nas raras ocasiões em que Jackson não esteve presente. Uma mulher hispânica, que se mantém em segundo plano e sempre vigilante. Não creio que qualquer coisa pudesse escapar de sua atenção e, se ela for ainda a babá, imagino a desaprovação que tenha dado a Jackson por aquela tolice na sacada.

As roupas das crianças pareciam ser escolhidas por Michael, no caso de Prince, e com a ajuda de Grace, no caso de Paris. Em ocasiões especiais, Prince tende a ser vestido como um pequeno lorde. Paris sempre pareceu usar vestidos delicados e rendados, levemente antiquados.


Como um pai de três, eu pude ver que Prince e Paris tinham aquelas saudáveis briguinhas que acontecem entre irmãos. Após uma refeição, Prince percebeu que Paris havia escondido sua fralda à mesa. "Paris tem uma fralda, Paris tem uma fralda", ele zombava.

Michael chamou a atenção para que Prince não risse, porque ele tinha uma daquelas também. O pequeno garoto pareceu castigado e um pouco embaraçado com a revelação. Meio minuto depois, mas desta vez quietamente, Prince começou novamente: "Paris tem uma fralda, Paris tem uma fralda..." Ela o ignorou.

Muitas das excentricidades de Jackson vão contra a disciplina severa de seu próprio pai. Com seus próprios filhos, Michael é rígido mas de uma maneira infinitamente mais afetiva e humana. Ele é decididamente anti-pancada, e, em algum lugar dentro da névoa obscura de sua mente perspicaz, existe uma sólida determinação de que seus filhos devem ter a criação mais normal possível.

Ele está particularmente ansioso para que, quando atinjam a adolescência, evitem as drogas e outras distrações de segundo plano do showbiz. Ele insiste que "não significa não", mas que disciplina deve ser administrada sem raiva ou grito.

Quando os filhos são malcriados ou grosseiros um ao outro, ele prefere tomar suas coisas e deixá-los parado num canto. Em casa, em Neverland, ele limita os brinquedos. Eles são proibidos de se referirem aos brinquedos como "meus", quando estão brincando com amigos, e são ensinados que a única razão para se ter dinheiro é a de compartilhar seus benefícios com os outros.

Um tanto surpreendentemente, Michael alega repreender rigidamente a vaidade. Ele conta como pegou Prince arrumando o cabelo no espelho e dizendo: "Eu estou ótimo". Michael o corrigiu dizendo: "Você está ok."

Prince e Paris também são ensinados a serem diplomáticos, mas nunca mentirem. Mesmo mentiras brancas são erradas, de acordo com seu pai. Ele prefere ensinar os filhos a "verem as coisas de uma dimensão diferente".

Prince, por exemplo, tem medo das turbulências nos aviões. "Se você lhe disser que ele não está num avião mas numa montanha-russa", Michael explica, "ele saberá que é mentira. Mas se você disser que estamos num avião, mas vamos imaginar que estamos numa montanha-russa, tudo se torna uma questão de ponto de vista."

Michael também é rígido consigo mesmo. Certo dia, quando ele estava gravando seu último álbum, Invincible, Prince foi ao estúdio e derramou pipoca no chão. Michael insistiu em limpar sozinho. "Foi meu filho que fez a sujeira. Eu a limparei", ele disse aos músicos estupefatos ao verem-no ficar de joelhos e mãos no chão.

O rabino Shmuley Boteach, amigo de Michael e anfitrião do jantar de Ação de Graças, acredita que o astro tem uma rara e natural empatia pelas crianças - possivelmente por nunca ter ele próprio crescido.

Ele conta da vez em que sua filha de oito anos de idade perdeu-se em Neverland. Ao encontrá-la chorando, seu instinto era dizer-lhe para não ser tão boba, mas Michael interveio e disse: "Eu sei como você se sente; lembro que isso já aconteceu comigo quando eu era pequeno".

Eu vi essa empatia muitas vezes. Michael fala com todas as crianças como se elas fossem adultos. Ele não tolera que elas interrompam uma conversa de gente grande, mas é surpreendentemente atento quando ouve uma voz de criança fazendo alguma pergunta, quando a maioria de nós prefere não dar importância.

Ele tem pavor de cachorros, mas comprou um Golden Retriever, pensando ser errado transmitir seu preconceito irracional. Ele também não gosta de inventar respostas para as perguntas complicadas das crianças; prefere ir à sua enorme biblioteca particular e procurar a resposta correta.

Então, o que Michael Jackson estava fazendo na cena agora infame da sacada? O que levou um homem obcecado a ponto de ser paranóico com a segurança de seus filhos a por em perigo seu bebê tão desnecessariamente?

Eu posso apenas imaginar que ele estava defendendo, de uma forma louca, outro de seus princípios - que as crianças devem ser ensinadas a não terem medo de nada. Ele me disse durante o jantar naquela noite que é apaixonado pelo perigo, mas não sabia por quê.

É difícil ver sua interpretação ganhar muito peso com os assistentes sociais que Michael pode encarar caso algo como o incidente de Berlim aconteça novamente. Entretanto, talvez, eles possam dar ouvidos a uma parte do discurso que ele fez sobre infância e seus filhos ano passado, na Universidade de Oxford:

"E, se quando eles crescerem guardarem rancor de mim, de como minhas escolhas prejudicaram suas juventudes, 'por que não tivemos uma infância normal como todas as outras crianças?', eles podem perguntar, nesse momento, eu rezo para que meus filhos presumam o melhor. Eles dirão para si mesmos: 'Nosso pai fez o melhor que pôde diante das circunstâncias singulares que enfrentou'."

"Espero", ele concluiu, "que eles sempre foquem as coisas positivas, os sacrifícios que fiz por eles, e não critiquem o que tiveram que abdicar ou os erros que cometi e que certamente continuarei a cometer. Pois todos nós somos filhos de alguém, e sabemos que apesar de fazermos os maiores planos e esforços, erros sempre serão cometidos. Isto simplesmente é ser humano."

Jonathan Margolis (escritor)

Fonte: Mail on Sunday